domingo, 3 de junho de 2007

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A violência policial começa dentro dos quartéis e seus bastidores

Júlio Ribeiro da Rocha

Desde meu ingresso nas fileiras da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, que os antigos me contavam fatos hilariantes praticados por muitos policiais. Interessei-me pelo assunto. Fui escrevendo-os, mas a história não parava, pois as coisas engraçadas continuavam acontecendo, das quais, algumas comigo.
Consegui escrever mais de 130 fatos que nos causariam risos.

Decorridos anos, já na reserva remunerada da corporação, resolvi escrever o meu 3º livro sobre as coisas em nada boas que causavam e causam transtornos aos PMs e à socidade - o nosso patrão maior. Paralelamente, eu analisava que não era bom passar para o leitor só o amargo. Daí, passei mais de 60 dias fazendo uma pesquisa nos arquivos da PM, todavia, sessenta por cento da história já estava gravada no computador que Deus me deu - o cerebro.
O meu livro conta algumas passagens do antigo Batalhão de Segurança, da Força Pública e chega até os dias atuais.
Nele estão também as vitórias conquistadas pela heróica Força Pública do Rio Grande do Norte.
Dando-lhe maior evidência, fui buscar o prafácio do doutor Carlos Adel Teixeira de Souza, Juiz de Direito, ex-capitão da PM/RN.
Eis a seguir alguns capítulos de: A violência Policial começa dentro dos quartéis e seus bastidores.


Tropa sem cultura.

Desde os tempos bem anteriores à denominação de Força Pública, que o efetivo policial era constituído por gente rude. A corporação antes de chegar ao último nome de Polícia Militar, recebeu diversas denominações, tais como Corpo Policial, Batalhão de Segurança. Sua certidão de nascimento, com o nome histórico de Corpo Policial - o seu primeiro nome -, tem registro na Resolução nº 27, datada de 04 de novembro de 1836, sancionada pelo senhor João José Ferreira de Aguiar, presidente do Rio Grande do Norte, com um efetivo de sessenta homens, sendo dois oficiais com o posto de primeiro e segundo comandante, um primeiro e um segundo sargento, um furriel, três cabos, dois corneteiros e cinqüenta soldados.
Com raríssimos policiais alfabetizados, porém, mantinha disciplina rígida e obediência às ordens recebidas na caserna, o que gerava, evidentemente, respeito por parte da população, que a considerava como a sua verdadeira guardiã.
Não obstante, os salários desvalorizados afastavam o interesse dos jovens cultos a sentarem praça no Corpo Policial.
No final do século XIX, era alarmante o baixo nível cultural das pessoas que procuravam os quadros do já Batalhão de Segurança, em vista de não existir atrativo que animasse quem sabia ler e escrever.
O Comandante Geral, major Manoel Lins Caldas, que comandou a instituição três vezes, sendo seu último comando de janeiro de 1895 a dezembro de 1913, utilizando-se do decreto governamental nº 51, de 20 de setembro de 1895, fez sucessivas inclusões publicadas nas ordens do dia, que depois mudou para Boletim Diário, Boletim do Comando Geral, Boletim Interno e Boletim Geral.
Na ordem do dia nº 898, de 24 de abril de 1900, foram incorporados cinco homens, mas só um sabia ler e escrever.
A Ordem do Dia nº 374, de 06 de maio de 1904, incluiu 31 homens, dos quais apenas 06 sabiam ler e escrever.


A aula regimental

Preocupado com o elevado índice de soldados analfabetos, bem como dos civis que sentavam praça, o major Manoel Lins Caldas, Comandante Geral do Batalhão de Segurança, criou a aula regimental e para dar conhecimento à tropa mandou publicar na Ordem do Dia nº 892, de 16 de abril de 1900.
A aula regimental se destinava aos praças e seus filhos. E foi instalada num dos alojamentos da própria unidade.
Na mesma ordem do dia, o comandante designou o soldado simples, da Primeira Companhia, Januário Avelino, que sabia ler e escrever, desembaraçadamente, para assumir a direção da aula.
Os oficiais não freqüentavam a aula regimental, mesmo porque o dirigente era um soldado raso. Deste modo, os praças iam adquirindo conhecimento, enquanto a oficialidade ficava para trás, motivando muita ciumeira e perseguições.
Os oficiais "analfas", que eram a maioria, indagavam:
"Pra que soldado estudando? Estudo é pra oficial. Soldado tem que ser burro."


Punições fora de quaisquer
parâmetros


A falta de uma formação mais humana, deixava o alto comando a mercê do atraso e da ignorância, sem tirocínio no agir, no fazer, no determinar.
Não existia nenhum regulamento, que servisse de orientação para aplicar as punições.
A situação humanitária e social do homem não era levada em conta. Não existia amparo à família, que vivia num desamparo total.
Comandantes cruéis e incultos, por coisas corriqueiras, aplicavam punições desajustadas, sem, contudo, distinguir os fundamentos do direito e da razão, não proporcionando ao subordinado a chance de promover defesa.
A impiedosa caneta do comandante escrevia, mas não raciocinava, agia sumariamente.
Assim, só para exemplificar, o comandante geral, pela Ordem do Dia n º 38, de 28 de março de 1901, puniu com oito dias de xadrez e rebaixou para soldado simples por 20 dias, o cabo de esquadra Manoel Gabriel da Costa. Isto quer dizer que, em um mês o policial punido recebeu 20 dias de vencimentos como soldado.
Na Ordem do Dia nº 30, de 10 de dezembro de 1906, o comandante Manoel Lins Caldas aplicou a punição de 10 dias de prisão nos cabos de esquadra André Avelino Bezerra e José Justino de Souza, rebaixando-os para soldados rasos, definitivamente, tirando-lhes uma nova oportunidade.
O comandante geral, apesar da sua preocupação com o nível cultural da tropa, tinha punho de ferro e cérebro de leão.



Sem meios de transporte

Naquele tempo, no alvorecer do século XX, não existia ainda o automóvel, e o trem de ferro estava para chegar.
Os meios de transporte conhecidos eram carroça, charrete, carro-de-boi ou o lombo animal.
A corporação não dispunha desses transportes. E só surgiu o Esquadrão de Cavalaria em março de 1914, que apenas atendia ao policiamento da capital e cidades próximas, como São José de Mipibu, Macaíba, Ceará Mirim e o distrito de Extremoz.
Os policiais, que eram transferidos para o interior potiguar ou seguiam em diligência andavam vários dias a pé, carregando o fuzil pendurado ao ombro pela bandoleira e a mochila a tiracolo com os seus pertences e a ração fria.

A escolta

Certa ocasião, nos idos de 1928, cujo Governador era José Augusto Bezerra de Medeiros, um cabo e um soldado saíram em diligência a pé, escoltando um perigoso preso que estava sendo transferido para cumprir pena na sua cidade natal, que ficava na fronteira do Rio Grande do Norte com o Estado do Ceará.
Mesmo viajando de trem boa parte do percurso, os policiais ainda caminharam a pé alguns dias. Já avistando a cidade para onde se destinavam, ao meio-dia, com o sol muito quente, o cabo aproveitou uma árvore bem frondosa para almoçarem e relaxarem um pouco.
Enquanto o graduado abria a sua mochila e retirava a ração fria que o quartel lhe fornecera, o soldado pediu permissão para ir atender a uma necessidade fisiológica. Subitamente, o preso aproveitou um descuido do cabo e fugiu.
O graduado tentou recapturá-lo, mas numa mata tão fechada, todo o esforço foi inútil. Desanimado e temendo as brutais punições que lhe seriam aplicadas pelo comando geral, ele resolveu concluir a caminhada e chegar à cidade, mesmo sem o preso, já que estava tão perto. Lá chegando, o qual procurou o posto dos Correios e Telégrafos. E passou o seguinte telegrama ao Comandante Geral da Força Pública.
"Sinhô comandante, participo vosmecê que enquanto o soldado cagava e eu comia, o preso fugia".
O comandante deu um despacho, publicado em boletim da caserna, que ficou famoso nos anais da corporação.
"Exclua-se esse comedor de merda".
15
O primeiro meio de
transporte

Finalmente, surgiu o trem,o primeiro meio de transporte, que se expandiu pelas cidades mais importantes do interior, interligando-se aos estados vizinhos.
As volantes da Força Pública, bem como os policiais transferidos para os destacamentos, viajavam de trem para grande parte do estado, por onde passava a estrada de ferro.
Os policiais de serviço não pagavam passagens, nem mesmo os de folga.
E assim, o suplício diminuiu para eles que chegavam de trem às cidades mais importantes e caminhavam a pé, apenas, alguns quilômetros ou léguas às cidades circunvizinhas.


Defensora incondicional

Em 1913 chegou ao Rio Grande do Norte o capitão do Exército José da Penha, potiguar nascido em Angicos, há anos ausente de sua terra natal.
José da Penha, que era amigo pessoal do presidente da República, marechal Hermes da Fonseca, veio com a missão de lançar o nome de Leônidas da Fonseca, tenente do Exército, filho do presidente, como candidato a governador pelo Estado do Rio Grande do Norte, contra o desembargador Joaquim Ferreira Chaves, este, apoiado por Alberto Maranhão, governador em exercício.
José da Penha, possuidor de um carisma incomum, conquistou a simpatia de grande massa popular. O qual visitou as cidades do interior e por onde passava conseguia impressionar o povo.
Ele, Leônidas da Fonseca e sua comitiva regressaram de trem à capital potiguar. O povo acorreu à estação ferroviária, no bairro da Ribeira, a fim de prestar-lhe homenagens e ouvi-lo discursar, pois ele se tornara respeitado no dom da palavra e não encontrou concorrente.
No desembarque, ele, que surgiu do nada, ficou perplexo com a monstruosa manifestação popular, inclusive com a banda de música de Macaíba, que era dirigida por um oficial da polícia local. A banda fê-lo vibrar tocando a canção Vassourinha.
As palavras habilidosas e demagógicas de José da Penha, que feito um cão feroz, ladrava violentamente contra os seus adversários, deixaram o povo enfeitiçado e não percebia que alguém de fora desejava tomar posse do território potiguar.
Naquela ocasião surgiu um tiro, não se sabendo disparado por quem, nem de onde partiu.
Este episódio foi o suficiente para o capitão João Bandeira e o tenente Joca do Pará, precipitadamente, entrarem em ação, provocando um desastroso incidente, saindo inúmeras pessoas feridas, sobrevindo péssima interpretação por parte dos seguidores de José da Penha.
Dias depois, circulou notícia pela cidade de que José da Penha iria marchar em direção ao palácio do governo, com o objetivo de provocar o governador.
Precavido, o tenente Rufino, comandando uma tropa, no início da noite cercou o prédio onde José da Penha se encontrava escondido, intimando-o a render-se e depor as armas, porém, não foi obedecido.
Em conseqüência, o oficial governista, bem armado com os seus soldados, deu-lhe voz de prisão, não obstante, foi recebido com um surpreendente tiroteio, que se prolongou até tarde da madrugada.
Fracassado no seu intento, José da Penha conseguiu fugir e foi se homiziar no quartel do Exército, enquanto os seus seguidores foram presos por Rufino e sua tropa.
O governador Alberto Maranhão, homem justo de caráter extraordinário, tão logo tomou conhecimento e não querendo revanche, imediatamente mandou colocar os presos em liberdade.
José da Penha fez sucessivas investidas, querendo, por ordem do marechal presidente, impor a candidatura de um homem desconhecido no estado. Um forasteiro. Um aventureiro que jamais estivera no Rio Grande do Norte. Que viera de longe querendo assumir o poder utilizando-se dos artifícios do capitão José da Penha.
À polícia estadual, que o povo a batizou de heróica, coube-lhe a primazia de esbarrar as ações do capitão Penha, deixando-o desmoralizado. Totalmente derrotados, Penha e Leônidas da Fonseca levantaram âncora com retorno ao Rio de Janeiro.

Ferrenha inimiga do cangaço

A história não deu férias à polícia potiguar. Vencedora, com bravura, na luta contra José da Penha, a qual se engajou na caçada aos bandos dos cangaceiros Lampião, Antônio Silvino e Jesuíno Brilhante.
Enfrentou confrontos sangrentos. Sofreu baixas e provocou baixas, sem, contudo, perder a hegemonia de uma tropa heróica, que lutava ferozmente, com perspicácia e esmero, apesar das dificuldades que abalava o sentimento da própria dignidade.
Com efeito, zelava pelo seu prestígio, que, vez por outra, ficava estremecido perante à sociedade, por causa de interferência política. Da politicagem sebosa...
O povo, porém, não a deixava de chamar de gloriosa e não escondia a disposição afetiva de orgulho que nutria pelos bravos soldados.
Com tanta glória, a presença de um policial, do mais alto posto ao mais simples soldado, era motivo de respeito e prestígio em todos os setores da sociedade potiguar. Para fazer valer a sua autoridade não precisava se utilizar de tantas armas...
A corporação contava com raríssimos homens alfabetizados, porém, íntegros.


A influência política

A interferência política cada vez mais presente dentro da corporação, causou profundos estragos à sua imagem, a qual foi perdendo o prestígio, com o moral em baixa.
Os policiais eram utilizados para fins eleitoreiros pela maioria dos políticos sem escrúpulo, com planos ao sucesso nas urnas.
Assim, a instituição servia de suporte para o sucesso político de indivíduos com muito poder, os quais, sem senso moral, utilizavam a máquina policial com o fito único e exclusivo de atender aos interesses políticos de suas regiões. Os policiais eram transformados em profissionais incapazes de ações próprias, e só falavam, agiam e procediam segundo a cartilha dos políticos locais.
Para ser incorporado na polícia era só falar com um político, e o cidadão, com poucos dias, estaria metido na farda, sem receber as instruções mínimas indispensáveis à profissão de preservador da segurança pública.


A Polícia foi brigar no
Maranhão

Em dezembro de 1925, o presidente da República, doutor Artur Bernardes, remeteu telegrama ao chefe do Executivo Potiguar, doutor José Augusto, através do qual solicitava o envio de tropas da gloriosa policia norte-rio-grandense para ir socorrer o Estado do Maranhão, que enfrentava uma luta sangrenta e sem possibilidade de vitória - se não recebesse ajuda de fora - contra a Coluna Prestes, que tinha à frente os oficiais do Exército Juarez Távora e Luiz Carlos Prestes, sob o comando deste, com a participação de alguns oficiais da Força Pública de São Paulo.
No dia 14 de dezembro daquele ano de 1925, a tropa do Rio Grande do Norte posicionou-se no cais da Capital Potiguar, na rua Tavares de Lira, no bairro da Ribeira. Uma multidão incalculável acompanhou-a desde o Quartel do Comando Geral da Força Pública, pois o povo sabia que, quando o assunto era patriotismo, a tropa miliciana não o decepcionava, apesar dos estragos deixados pela politicagem vil. A Banda de Música da corporação, também para lá foi e saudou os seus companheiros com a execução de um dobrado.
Eram cem homens comandados pelo capitão Apolinário Augusto Seabra de Melo.Os policiais ficaram envaidecidos com a veemente e emocionante manifestação do povo, especialmente quando a poetisa Palmyra Wanderley fez uma calorosa saudação aos seus conterrâneos da farda.
A tropa recebeu ordem para embarcar num vapor do Loide Brasileiro. E o povo - parentes e amigos - derretia-se em lágrimas, com muito choro. Ocorreram vários desmaios, e as vítimas foram socorridas no local mesmo por diversos médicos que lá estavam.
No sexto dia, a tropa potiguar chegou à capital de São Luiz, Estado do Maranhão, que estava deserta, em virtude das ameaças de ser invadida pelos rebeldes fardados, que travavam lutas sangrentas no interior do estado.
De São Luiz a tropa foi deslocada para Flores, no interior do Estado do Maranhão, onde se localizava o grosso dos revoltosos, que já contavam vitória ante a escassez da tropa governamental daquele estado.
Na adolescência da noite do dia 31 de dezembro, a Coluna Prestes, contando com maior poder de fogo e superioridade de efetivo, investiu contra as forças legalistas.
Teve início o mais violento combate que a Coluna Prestes enfrentara, indo até perto das onze horas do dia seguinte. Os bravos policiais potiguares lutavam sem temer a fúria inimiga.
Naquele "front" outras tropas amigas lutavam ao lado dos policiais potiguares. As forças aliadas enfrentavam intenso fogo adversário, e fizeram manobras estratégicas surpreendentes, deixando os rebeldes desorientados e sem o domínio de comando.
Naquele combate, o sargento Augusto Azevedo, da força do Rio Grande do Norte, morreu crivado pelas balas inimigas. Ele lutou com incomum heroísmo.
Lutou com espantosa e extraordinária coragem!
E, ainda na fumaça da pólvora, foi promovido a segundo tenente por bravura "post mortem" , por ato do governador potiguar.
As tropas inimigas caíram em sucessivas armadilhas astuciosamente montadas por nossos bravos policiais e foram perdendo a resistência . O inimigo foi fraquejando. Já não tinha munição, nem força física para lutar no corpo-a-corpo.
Cessado o combate, o capitão Juarez Távora procurou verificar suas baixas. Estonteado e derrotado, o capitão rebelde entrou no "front" inimigo, onde ficou rodopiando quando foi preso por policiais das forças legalistas.
Ao capitão Apolônio Seabra, auxiliado pelo sargento João Paulino e alguns soldados, todos do Rio Grande do Norte, coube-lhe a missão de escoltar o preso até à cidade de São Luiz.
Rendido o inimigo, a tropa potiguar retornou à sua terra natal. No dia 25 de fevereiro de 1926, num navio do Loide Brasileiro, os bravos oficiais e praças,desembarcaram no cais de Natal.
No amanhecer daquele dia, antes que o sol mostrasse os seus primeiros raios, o povo já ocorria ao cais, na rua Tavares de Lira, no bairro da Ribeira, a fim de saudar a heróica tropa conterrânea, com apenas uma baixa que fora a do sargento Augusto Azevedo, cujo corpo ficou repousando eternamente no solo maranhense.
Após a chamada regulamentar em presença dos olhares atentos do público, a tropa se dirigiu ao seu quartel, indo à frente o Comandante Geral, tenente-coronel Joaquim Anselmo, acompanhado pelo representante do governador José Augusto, seguindo-se a família miliciana e uma multidão civil incalculável, que, ao longo da caminhada, gritava viva e batia palmas, saudando a gloriosa tropa.
Todos saudavam a imbatível tropa potiguar!



O descaso dos governantes

Apesar de ser detentora de tantas glórias, a Força Policial passou anos jogada no esquecimento por alguns governantes déspotas, sem desfrutar do prestígio perante eles, que não se preocupavam com a imagem da instituição.
Seus integrantes viviam ao desleixo do estado, que não investia na aparência pessoal dos policiais. E muito menos na sua preparação. Viam-se soldados barbudos, de costeletas, cabeludos, com farda suja, desbotada e esfarrapada, além da péssima remuneração que o estado lhes pagava.
Com efeito, eles não transmitiam tranqüilidade para a população, senão aos setores palacianos onde o estado os vestia elegantemente, com a sua farda branca, com todas as pompas para o prazer dos nobres.
Não existia curso de formação a fim de selecionar os melhores. As promoções continuavam acontecendo mediante antiguidade, bravura ou por interferência de pessoas alheias aos quadros da corporação - os políticos e seus xeretas.
Foi por este tempo, que um governador deu um aumento de 10 réis, nada mais, nada menos do que o preço de um cafezinho comprado nos barracos do Mercado Público da Cidade Alta, que anos depois fora destruído por um incêndio, que convocados os Corpos de Bombeiros da Polícia Militar, da Base Naval e da Força Aérea Brasileira, não conseguiram debelar suas chamas. Em cujo local deu espaço à construção do prédio da Agência Central do Banco do Brasil.


O dispertar para nova visão

As lutas travadas com muita estratégia pelos bravos soldados do antigo Batalhão de Segurança - sem treinamento necessário a um bom desempenho - contra José da Penha, Coluna Prestes e o cangaceirismo, não serviram para alertar, até então, os nossos governantes, que a instituição estava precisando melhorar o perfil dos seus integrantes.
No decorrer de alguns anos, o doutor Juvenal Lamartine de Faria, chefe do executivo Potiguar, de 1928 a 1930, despertou para esta realidade. E enviou ao Poder Legislativo anteprojeto de Lei, pelo qual dava direito aos sargentos de escola do Exército, possuidores do curso de Infantaria, adentrarem ao quadro de fileira da força estadual, como aspirantes a oficiais.
O primeiro graduado do Exército, que trocou a farda verde-oliva pela de cáqui foi o sargento Severino Raul Gadelha, que chegou ao elevado posto de coronel.
Ao aspirante Gadelha foi lhe incumbida a missão de educador, instruindo os policiais, utilizando-se dos ensinamentos que aprendera na escola, tornando-os disciplinados e fiéis aos ensinamentos recebidos.
A Gadelha não lhe foi fácil, todavia, o exercício da missão tão árdua que recebera, visto que ocorria uma literal mudança de paradigma, enfrentando resistência de preconceitos decadentes, razão pela qual não encontrou na corporação um oficial capaz para auxiliá-lo.
Para ajudá-lo naquela tarefa, o governo assinou decreto promovendo João Batista Rodrigues a aspirante a oficial, egresso do Quadro de Sargentos de Escola do Exército, o qual, porém, teve passagem rápida pelas fileiras da corporação, vez que faleceu com dois anos de farda.

Os bravos policiais do RN
foram lutar em São Paulo

Aexemplo do Estado do Maranhão, os bravos policiais potiguares nem sequer baixaram a poeira direito e já partiram para nova frente de batalha. É que o Estado do São de Paulo se levantou contra a política do presidente Getúlio Vargas, em julho de 1932, cujo movimento recebeu o nome de Revolução Constitucionalista.
Por solicitação do governo federal, uma companhia comandada pelo capitão Severino Elias Pereira, no dia 5 daquele mês de julho, embarcou de trem, passando pelo Recife, com destino ao Rio de Janeiro.
No campo de batalha, no território paulista, tombou ferido de morte o segundo tenente Alberto Gomes, da tropa do Estado do Rio Grande Norte, que fora num segundo comboio. O qual, por decreto do governo do estado, foi promovido a primeiro tenente, por bravura.
Os paulistas revolucionários foram derrotados. E as tropas legalistas, não só do Rio Grande do Norte, mas de vários estados aliados, retornaram aos seus quartéis de origem.
Com exuberante orgulho, nossa tropa chegou sob monstruosos aplausos na terra e no ar. Na terra, com palmas e vivas. No ar, uma assustadora pirotecnia com os arrojados estrondos de foguetões cortando o espaço natalense, enquanto o Comandante Geral, major José Vitoriano de Medeiros, vislumbrava os seus olhares sobre a tropa vencedora, de invejável bravura, manifestando grande exaltação, transformando-a em agradecimentos e elogios publicados no Boletim Diário do Comando Geral, laureados pelo vernáculo cuidadoso do comandante geral.


A intentona comunista

Perto das oito horas da noite do dia 23 de novembro de 1935, tropas do Exército pertencentes ao 21º BC aderiram ao movimento comunista, com várias ramificações no país.
Bem armados, os rebeldes fardados prenderam diversas autoridades militares, inclusive do Exército, e marcharam para o Quartel da Força Pública, onde encontraram heróica resistência, apesar de um efetivo reduzido de 50 homens, ao qual somou o coronel do Exército José Otaciano Pinto e o tenente Bilac de Farias, da Força Policial, este, teve acesso ao quartel passando pelo meio do fogo inimigo.
Bilac de Farias penetrou no meio dos comunistas, fazendo-se de um deles. Para confundi-los, o oficial, de pistola em punho, atirava contra o quartel da força policial até ultrapassar o inimigo e juntar-se aos seus companheiros milicianos.
Conheci Bilac de Farias, que era cirurgião-dentista, e pedira demissão da corporação para assumir uma cadeira de sua especialidade na Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Ele, com um luzeiro nos olhos e voz trêmula de emoção e já passando dos 60, nos contou esta história, no programa SBSS em foco na Rádio Rural de Natal, que tinha a direção e locução dos diretores da Sociedade Beneficente dos Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar, no final da década de 1960.
Com o quartel cercado, os policiais enfrentaram 19 horas de incessante fogo. Aquartelada e sem temor, a tropa lutou com destacado patriotismo. Com arrojada determinação, sem alimentação e água, em momento algum, nenhum soldado demonstrou fraqueza, posto que o sangue patriótico lhe pulsava forte.
O pior, contudo, aconteceu... Esgotara-se a munição. Foi disparada a última bala, portanto, o último cartucho. O major Luiz Júlio e o coronel José Otaciano Pinto reuniram a tropa. Constataram a baixa do 26 soldado Luiz Gonzaga, que teve morte instantânea, além de quatro feridos.
Naquele momento..., o que fazer? Enfrentar as armas rebeldes seria suicídio.
Sem munição, a tropa instruída pelos dois oficiais superiores conseguiu furar o cerco inimigo através de descida em cordas pelos fundos do quartel.
Os rebeldes do 21º BC logo descobriram que os comunistas civis só queriam o poder e saquear os pontos de grande movimento da cidade, razão pela qual abandonaram a luta.
O ponto forte que favoreceu a resistência no interior do quartel, sem dúvida, foi o alto grau de disciplina e companheirismo dos quais a tropa se achava portadora.
Os comunistas da farda estavam certos de uma vitória esmagadora sobre as tropas legalistas, pois, simultaneamente, atacaram a Casa de Detenção e o Quartel do Esquadrão de Cavalaria, porém, encontraram surpreendente resistência.

Os cursos

Com a facilidade para freqüentar os colégios, o nível intelectual foi mudando dentro da corporação, com policiais falando linguagem diferente da costumeiramente falada na caserna.
Mas os analfabetos de posto superior faziam barreiras infernais contra os intelectuais, além de punições injustas, às vezes, acabavam com a conduta do homem para expulsá-lo da corporação.
Em meio a tudo isto, o governo determinou grandes mudanças dentro da Força Pública, entre elas a criação de seleção interna para os cursos de oficiais, sargentos e cabos. E assim, em 1935, ocorreram os primeiros cursos de oficiais e de cabos.
A despeito dos cursos, ainda continuava a ingerência dos políticos, cujos protegidos passavam voando pela seleção, pousavam no curso e decolavam promovidos.
Os oficiais, porém, desenvolveram maior poder, aprovando os seus "peixinhos", mas prejudicavam os de melhor saber intelectual. Na hierarquia, os bajuladores dos oficiais e os da politicagem eram promovidos a todo vapor, especialmente, aqueles que levavam presentes para os seus superiores, dando brecha aos policiais despreparados subirem na escada hierárquica com maior rapidez em detrimento dos capacitados.
Os perseguidos, mesmo aprovados em seleções internas para graduados ou até para oficiais, não conseguiam se matricular para os cursos, que lhes possibilitariam várias mudanças profissionais, porque, por qualquer coisa tola, os oficiais prejudicavam os policiais que não eram de sua simpatia para dar lugar os seus protegidos, além de ficarem perseguindo-os com transferências aleatórias e punições perversas. Muitos eram barrados logo no pedido de inscrição para fazer a seleção.
E quem se habilitasse a reclamar seria ameaçado com prisão ou até expulsão, e teria mesmo que ficar calado.
Com isso, não quero dizer que todos os oficiais de maior posto fossem ruins. Não! Jamais o direi. Eles eram a minoria, além de puxa-sacos..., perversos..., porém, com muito poder devido a função importante que sempre assumiam.
Do outro lado, estavam os bons. Os que não perseguiam e que, se não pudessem ajudar, não atrapalhavam. Não citarei os seus nomes, por mais merecidos que o sejam, para não melindrar a descendência dos maus.

Surgiu a primeira lei
disciplinar

Em 1935, o Comandante Geral da Força Pública, major Luiz Júlio, aplicou algumas punições severas.
No boletim regimental nº 07, de 05 de novembro daquele ano, o comandante rebaixou definitivamente a soldado, o cabo de esquadra Joaquim Francisco da Silva, sem fazer referência a qualquer dispositivo de lei. Num texto do boletim, o comandante esclareceu:
"Em virtude do seu péssimo comportamento, quando destacado na cidade de São José de Mipibu".
No boletim regimental nº 09, de 07 de novembro de 1935, portanto, após dois dias do rebaixamento do cabo Joaquim, o major comandante excluiu o soldado nº 491 - José Ferreira da Costa, de acordo com a letra "b", do § 1º, do artigo 38, do regimento em vigor, sem, entretanto, citar que regimento seria aquele.
Talvez já existisse um regulamento disciplinador das punições, provavelmente do Exército, mas os comandantes o desprezavam, preferindo utilizar o poder que lhes era inerente e agiam com violenta severidade. Com toda estupidez!


Os regulamentos

Passaram-se alguns anos. Em 1937, já no Estado Novo, a instituição adotou os regulamentos disciplinares, de serviços gerais e instrução do Exército, do qual passou a ser sua reserva.
A imagem da instituição estava sendo seriamente maculada, com as permanentes interferências políticas, mas, já com a resistência de alguns policiais, em razão dos bons ensinamentos que foram 29 implantados por Gadelha, que além de mudar o comportamento da tropa, conseguira formar instrutores oriundos dos quadros da corporação.
As punições aplicadas contra os policiais continuavam não seguindo os parâmetros jurídicos. Os acusados não tinham direito de defesa. E o regulamento do Exército nem sempre era seguido, pois os comandantes preferiam aplicar as punições à maneira deles.
O oficial dizia "está preso" e mandava recolher o subordinado ao xadrez pelos dias que achasse conveniente, tratando-o como um desvalido. Um "cão sem dono".


O coronelismo

Desde o tempo bem anterior ao surgimento das batalhas fora do domínio potiguar, que ocorria a interferência da força dos coronéis, cujo título era consagrado aos grandes proprietários de terras no interior - os responsáveis pela economia latifundiária -, com muito poder junto aos governantes, inclusive para colocarem seus protegidos na Força Pública e outros setores do Poder Executivo Estadual.
E assim, grande parte da força policial ficava comprometida com esses poderosos oportunistas inescrupulosos.
Desta feita, a entrada na Força Pública, acontecia por interferência dos segmentos nobres - os coronéis e os políticos.

Sem processo seletivo

AForça Pública não adotava nenhum processo seletivo para incluir o cidadão nas suas fileiras. Como já foi dito, o homem procurava um político da região ou um coronel; e com poucos dias estava sendo incorporado.
Se o protegido fosse do interior, ficaria por lá mesmo sem receber os treinamentos que a profissão exigia. Tudo a pedido do protetor, que o mantinha sob o seu controle, utilizando-o para realizar serviços sujos, totalmente incompatíveis para com a profissão policial militar.

Os policiais faziam os
gostos dos poderosos


Os soldados, os graduados, os Delegados de Polícia, por fim, os oficiais com acento na tropa, cumpriam, fielmente, as ordens recebidas dos coronéis, dos políticos e seus xeretas, desde que fossem da corrente política dos governantes, que transformavam a polícia em instrumento político a serviço deles em prejuízo dos adversários.
Na mesma subserviência viviam os coronéis, que sempre dependiam de um político para assumir cargo de comandante geral, mas ficavam refém do protetor e seus aliados.
Os comandantes, a maioria com pouquíssima cultura, não se negavam aos pedidos políticos tanto para promover os seus "peixes", colocar gente na farda ou fora dela.
Tudo conforme os caprichos dos políticos, deixando por terra o conceito da instituição.



Tirar a farda

Da maneira que os políticos e os coronéis colocavam o cidadão na corporação, com mais rapidez tiravam-lhe a farda.
Por qualquer deslize praticado por um policial militar, do delegado ao soldado, seguiam-se as ameaças de "vou tirar sua farda".
Àquelas ameaças os policiais tinham verdadeiro pavor. Muitos, como pai de família, temendo uma expulsão ou exclusão e perderem o emprego se humilhavam perante os seus ameaçadores.
Essa expressão tão curta, mas, apavorante, por longos anos virou moda dentro da corporação ou fora dela.
Por pequena quebra do bom procedimento, até prostitutas ameaçavam de "tirar a farda" de um policial militar.
Um desses exemplos foi o caso de um soldado do Destacamento Policial de uma cidade da Grande Natal, que deu uns pontapés num eleitor desordeiro de um chefão político local, que mandou tirar a farda do praça.
Após 30 dias desse fato, o chefão mandou chamar o ex-policial e perguntou:
- Está arrependido?
- Estou, sim, senhor.
- Vá botar a farda, que eu vou mandar avisar ao comandante.

A Expulsão ou Exclusão

Além daquela frase curtíssima "tirar a farda", pior era a expulsão. Esta, sim, fazia o cidadão tremer nas bases. O policial era excluído por haver praticado atos de indisciplina mais comuns sucessivas vezes, podendo gerar até uma expulsão.
Na exclusão, o policial militar perdia a farda e saia livre para a sua residência.
Na expulsão, o elemento perdia a farda e do quartel saia escoltado direto para a Chefatura de Polícia, onde seria fichado, não podendo tirar documentos ou assumir emprego no decorrer de dois anos.
O ato de expulsão era, simplesmente, uma coisa deprimente e nojenta. Ao meio-dia, hora da leitura normal do boletim da caserna, o corneteiro da sala das ordens tocava formatura geral. E a tropa de serviço, de folga e das repartições, inclusive os oficiais, rapidamente, entrava em forma no pátio anterior do quartel.
Ao mesmo tempo vinham se aproximando dois soldados da guarda do quartel escoltando o PM que se encontra recolhido ao xadrez.
Ele era a vítima!...
A escolta colocava o coitado em frente à tropa. Um oficial lia o ato de expulsão, inserido na quarta parte do boletim da caserna, assinado pelo comandante geral, que era o responsável por aquele macabrismo. Em seguida, o corneteiro cumprindo ordem, executava o toque de "meia-volta volver", e a tropa virava-lhe as costas, enquanto os dois policiais do seu lado rasgavam-lhe a farda, deixando-o só de cueca, quando o desditoso não levava uma roupa civil por baixo da farda.
Durante a execução desse ato lúgubre, uma banda de fanfarra tocava seus clarins e rufava seus taróis. E a tropa, tomada pela emoção, caricaturava a face, e até dilacerava os seus sentimentos, pois, com a consciência em pânico, ficava constrangida e consternada.
Essa cena tornara-se comum às vistas da tropa, que a repudiava tanto... Que sofria um terrível bombardeio moral!
E ainda teria que responder ao segundo expediente que se prolongava até às 18:00 horas, mesmo saindo de serviço, teria que permanecer no quartel.

As promoções

Amaioria das promoções continuava ocorrendo por influência política, por bravura, bons serviços prestados à instituição ou pela graças dos oficiais, ignorando, deste modo, a existência das seleções internas. Às vezes, o cidadão já entrava promovido a tenente, a sargento ou a cabo. E chegava até coronel.
A exemplo disso, existe dentre muitas, a história do sargento, mais conhecido por Manelofrazo, o qual era compadre do doutor Rafael Fernandes, governador do Rio Grande do Norte, no período de 1935 a 1943.
Manelofrazo estava trabalhando de enxada no seu roçado, num interior próximo à cidade de Mossoró, quando chegou um seu compadre gritando:
"Compadre Manelofrazo, corra e vá se apresentar em Mossoró que Rafaé lhe colocou na Força Pública como 3º sargento".
Manelofrazo colocou suas divisas sem receber as instruções necessárias para portá-las. E ficou servindo na Companhia de Polícia, com sede naquela cidade interiorana.


Luto pela esposa


Sem as instruções indispensáveis a um graduado, o sargento Ambrósio, de cor bem escura, estatura média, com modos legitimamente beradeiros, aprontou uma que ficou registrada no folclore da instituição.
Fazia dois anos que ele estava na corporação, quando sua mulher faleceu, deixando órfãos dois filhos pequeninos.
Desorientado, o sargento tingiu de preto a sua farda e no dia seguinte foi para o quartel. O referido policial militar parecia com um urubu.
Aquele policial fardado todo de preto dentro do quartel, causou espanto à tropa. À medida que ele ia passando os policiais disparavam em gargalhadas.
O qual foi logo chamado para justificar-se perante o seu comandante da companhia, que o ameaçou com severas punições, mas Ambrósio conseguiu se justificar alegando que não havia recebido os ensinamentos completos.

Se vosmecê errar
o tiro, morre

Um cidadão, residente no interior do estado, aproveitou-se da sua influência política e foi incorporado na Força Pública como 2º tenente. A pedido do seu protetor, ele ficou lá pelo interior, sem, contudo, receber as instruções necessárias para fazer parte da oficialidade.
Certa vez, o dito tenente foi convocado para ir à Natal, a fim de participar de uma reunião com os oficiais, no Gabinete do Comando Geral da Força Pública.
Aproximando-se ao portão principal, a sentinela fez a continência de apresentar armas para o tenente, conforme determinava o regulamento militar.
O oficial, que não entendia bulhufas sobre as honras militares, achou que o soldado queria atirar nele. Deu um passo atrás, puxou a sua pistola conhecida como parabélum e gritou:
"Se vosmecê errar o tiro, morre, cabra da peste!"


As proezas do
capitão Justino

Justino era um crioulo corpulento, que só fazia matutice.De soldado raso, ele chegou ao posto de coronel, sem fazer sequer o curso de cabo de esquadra. E deixou uma história hilariante cheia de proezas.
Uma das suas façanhas ocorreu em novembro de 1935. Os comunistas, apoiados pela tropa do 21º BC, tomaram o Quartel da Força Pública, assumiram o governo do Estado do Rio Grande do Norte, e colocaram à frente da Chefatura de Polícia um homem amorenado, residente no Canto do Mangue, no bairro das Rocas.
Empossado em sua pasta, o novo Chefe de Polícia mandou prender os oficiais que eram contra o golpe, dentre os quais estava o capitão Justino, que se considerava inimigo ferrenho dos comunistas.
Justino foi recolhido, com outros presos, a um xadrez que ficava ao lado da Chefatura de Polícia, no bairro das Rocas. Morrendo de sede, o crioulo miliciano pediu água e foi prontamente atendido pelo negrão das Rocas, mas com uma lata cheia de urina, que a jogou na cara do capitão anticomunista.
Acontece que o trono comunista teve passagem rápida. E com três dias foi a pique. Quem houvera usurpado o poder procurou se esconder, enquanto as autoridades constituídas reassumiam os seus cargos e os presos políticos eram postos em liberdade.
Fora do xadrez, Justino na mesma hora mandou selar o seu cavalo bom na captura de bandidos, colocou na cintura o seu bacamarte cheio de balas novas, bem como o seu espadagão rabo-de-galo. Montou-se no cavalo esquipador exclusivo de sua montaria, que igual a ele não existia. O capitão crioulo foi direto para o beco onde morava o ex-Chefe de Polícia, no Canto do Mangue.
De longe, ele avistou o cidadão, que para a sua desventura, a única saída do beco estava tapada pelo miliciano.
Sem chance de escapar das ferozes garras do seu rival, a única saída encontrada pelo ex-Chefe de Polícia foi tibungar dentro do Rio Potengi, pois para tal era exímio nadador e mergulhador.
Justino riscou o cavalo na beira do rio e ficou com o bacamarte na mão, esperando que o seu perseguido colocasse a cabeça fora d’água, a fim de crivá-lo de balas, visto que na pontaria não tinha concorrente.
Quando o crioulo deu as caras, foi lá pelo meio do rio e fora do alcance da mira do capitão, o qual foi estirando o dedo para Justino e gritando:
"Taqui, nego filho de uma puta!... Vem me pegar!"


Os alfabetizados eram
perseguidos

Antes e durante a Segunda Guerra Mundial, entre a agitação do momento e o desleixo dos comandantes, a instituição passou por bruscas mudanças, inclusive a suspensão da aula regimental, criada pelo major Manoel Lins Caldas, que melhorou e muito o grau de intelectualidade da tropa.
O número de analfabetos era predominante, pois sentar praça seria péssimo negócio, dando estrada à intelectualidade, posto que os sem cultura e sem emprego, notadamente do interior, buscavam as fileiras da polícia.
A influência política fez a corporação sofrer um brutal processo de regressão ao seu longínquo passado, promovendo gente analfabeta e sem receber as instruções da caserna.
A rudez ocupava espaço desde o oficialato aos praças.
Disse-me José Esmeraldo Cavalcanti, 1º sargento reformado da Polícia Militar, praça de 1945, atualmente com 78 anos de idade, testemunha que o atraso era tão grande, que na sua turma de 73 novos soldados, só ele e outro companheiro sabiam ler e escrever.
Ser culto seria motivo de perseguição. E até de indignação. O homem sem cultura recebia poucos ensinamentos básicos e teria que cumprir cegamente as ordens recebidas, sob o crivo diuturno cruel dos mais graduados.
Os mais antigos, formados por Gadelha e seus auxiliares, tiveram muita dor de cabeça, principalmente, da maioria dos oficiais, que perseguiam os praças que sabiam ler e escrever, especialmente, os que estudavam, e só lhes aplicavam punições crudelíssimas.
Para esses oficiais, o soldado "burro" era bom. E não trocavam um soldado "burro" por dez inteligentes. Diziam!...
Foi no tempo de maior guerra contra os cultos dentro da corporação, que numa certa tardinha um capitão ia passando pelo Grande Ponto – o Centro da Capital -, quando se deparou com um cabo que lia fluentemente o jornal Diário de Natal.
Morrendo de inveja porque era "analfa", o capitão dirigiu uma parte ao seu comandante geral, este mandou chamar o cabo à sua presença para justificar-se por tamanho ato de indisciplina.
O cabo, que era mesmo intelectual, respondeu ao comandante:
"O capitão disse mesmo a verdade... Eu estava enobrecendo o nome da corporação."


A história de Vitoriano

Vitoriano era um soldado muito estudioso. Por isso, alguns oficiais não lhe davam guarida com tanta perseguição. Até que ele ficou na má conduta.
Foi expulso, com a farda rasgada e entregue à Chefatura de Polícia para ser fichado.
Ao transpor o portão do quartel, Vitoriano olhou para trás e disse:
"Eu vou voltar e haverei de comandar esta merda".
Vitoriano não parou de estudar. Após dois anos, limpou o seu nome na Chefatura de Polícia. E fez a Escola de Sargentos do Exército.
Já como 2º sargento, ele foi convidado para vestir a antiga farda como aspirante a oficial da Força Pública. E aceitou.
Vitoriano chegou ao posto de major - patente mais elevada daquela época - e comandou a corporação com justiça e honradez, não tolerando nenhum tipo de perseguição durante o seu comando.


A pé ao Rio de Janeiro

Cabo Feitosa, moreno, de porte atlético, gostava de aventuras. E não perdia oportunidade.
A maior de todas foi a sua ida a pé à capital do Rio de Janeiro, em companhia do soldado Miguel, mais conhecido por Miguel soldado.
Foram três meses de viagem, e finalmente chegaram à Capital do Rio de Janeiro, e foram recebidos com muita honraria pela polícia local.
O retorno de Feitosa e Miguel soldado, porém, não foi coroado de honras pela Força Pública do Estado do Rio Grande do Norte, como fizera uma corporação tão distante.
Feitosa e o seu companheiro de viagem passaram longos anos recebendo tratamentos grotescos protagonizados por oficiais e praças crápulas.
Essa história me foi contada pelo próprio cabo Feitosa, lá pelos idos de 1970, o qual atualmente tem 87 anos e está morando no Rio de Janeiro.



P u l i ç a


No tempo que polícia se escrevia com pu...li...ça, o sargento Delegado de Polícia da Cidade de São Bento do Bofete, no interior do Estado do Rio Grande do Norte, foi chamado, às pressas, à sua delegacia, por volta das vinte e três horas, a fim de lavrar um auto de prisão em flagrante delito contra um elemento forasteiro, que acabara de praticar um homicídio na pracinha da cidade.
Presentes o condutor, as testemunhas e o escrivão, o delegado começou a lavratura do auto:
"Aí, pelas vinte e três horas e quarenta minutos desta sexta-feira..."
Quando o escrivão interrompeu:
"Seu delegado, sexta-feira se escreve com x ou com s?"
O sargento delegado, todo enrolado, determinou:
"Homem, sabe duma coisa! Bota esse negócio no sábado mesmo, também só faltam vinte minutos!..."


Os políticos não perdoavam

Entre os anos de 1945 a 1954, os policiais militares vive-ram momentos de amarguras e sucessivas perseguições, que fugiam à sensibilidade humana.
Os governantes, senhores absolutos e arbitrários, colocavam no comando da corporação oficiais carrascos e fiéis aos seus repugnantes desejos.
Um desses governantes, ao assumir a chefia do executivo potiguar, designou para comandar a PM um coronel puxa-saco, homem de natureza cruel, que era o terror da tropa. Foram-lhe dadas severas ordens para perseguir, humilhar e massacrar os policiais que não votaram nele.
O impiedoso comandante, que já conhecia no meio da tropa os adversários político do governador, de uma única vez agregou 60 sargentos e subtenentes, suspendendo-lhes o pagamento mensal, os quais ainda foram obrigados a responder pernoite diariamente.
As esposas dos policiais punidos foram ao Palácio do Governo pedir clemência ao governador. Ele, contudo, as tiranizava impondo-lhes regras ridículas e imorais.
O comandante as desdenhava .... Deixava os policiais - seus companheiros de farda - a mercê de pretensões lunáticas e desenfreadas daquele governante, que as praticava como um hobby.

O telefonema


Dois cabos cursados, que primavam pela pureza no falar, estavam discutindo sobre assuntos gramaticais, quando se encrencaram com a palavra telefonema.
Um dizia que a palavra certa seria o telefonema, mas o outro teimava dizendo que seria a telefonema.
Em meio àquela discussão que já estava calorosa, eis que vem se aproximando um coronel, que se preparava para ser transferido para a Reserva Remunerada, com o qual os dois graduados resolveram tirar aquela dúvida idiomática; e um deles dirigiu-se ao coronel:
nDá licença, seu coronel!.
nDiga, cabo – atendeu o coronel.
nSeu coronel, a palavra certa é o telefonema ou a telefonema?
n Oi, as duas tão certa... É pruquê uma tá no plural e a outra tá no singular – concluiu o coronel.


A balaiada

Já na década de 40, no Governo José Varela, mesmo com o advento dos cursos para graduados e oficiais, o comandante geral decretou uma verdadeira avalanche de promoções dentro da corporação, a fim de atender aos pedidos políticos. Foi promovido quem sabia ler, quem não sabia. E quem não merecia.
Esse episódio ficou conhecido na corporação como a balaiada. E por muito tempo perdurou essa história. Quando um policial conseguia uma promoção e não tinha bons estudos, surgiam logo as críticas de que o cidadão fora promovido no balaio.
De fato, isso não faltava no meio da tropa, considerando a ingerência política e o apadrinhamento interno.


Um escalonamento
só para os oficiais.

Foi no Governo do senhor Sílvio Piza Pedrosa, que esteve à frente do Executivo Potiguar no período de 1951 a 1956, que os coronéis conseguiram a aprovação da Lei Estadual nº 1.416, equiparando os seus vencimentos aos do juiz de primeira instância, seguindo-se um escalonamento vertical para os demais oficiais, enquanto o resto da tropa não teve direito a um centavo.
Os oficiais levavam vida de marajás, ao passo que a sargentada e a soldadesca recebiam o pior salário pago no país.

Criação da CEAS

No mês de janeiro de 1951, Luciano Veras Saldanha, coronel de Cavalaria do Exército, assumiu o comando da já Polícia Militar.
Luciano encontrou uma tropa empobrecida, com fardas e coturnos rasgados. E sem prestígio. Encontrou uma polícia andando de tamancos, como os próprios policiais diziam.
A primeira providência de Luciano foi dar farda e sapatos novos aos soldados. E melhorou a ração do rancho, pois a que era servida à tropa, nem os pedintes comiam.
Com o seu espírito de homem justo e honesto, resolveu fundar a CEAS – Caixa de Economia e Assistência Social -, naquele mesmo ano.
A finalidade da CEAS seria prestar assistência ao policial necessitado, quando o caso se enquadrasse no regulamento da nova entidade..
O comando geral determinou que fosse efetuado o desconto da contribuição mensal nos vencimentos dos praças e dos oficiais, em favor da CEAS.
Além desse desconto, quando falecia um policial militar seria descontado um pecúlio igual à mensalidade social, que seria destinado à viúva e os filhos do falecido.
O pagamento do pecúlio acontecia 30 dias após o falecimento do policial.
Para administrar a CEAS foi nomeado um oficial superior; para secretário e tesoureiro dois oficiais de menor posto. Os praças que davam a maior contribuição não participavam da diretoria. Não lhes foi dado o direito de opinar. Ficaram alheios aos acontecimentos.
Os que lá estavam comandando, não demonstravam interesse nos direitos da tropa, aos quais o comandante geral vivia lhes dando bronca, além de outros corretivos, pois nisto ele era justo.
A mensalidade social representava o capital em caixa, só utilizado em alguma eventualidade, desde que o beneficiado fosse policial militar e por motivo extremamente grave.
Assim, a CEAS foi juntando elevada importância em espécie. O comandante Luciano achou conveniente conceder empréstimos aos policiais, mediante juros de pequena taxa.
Deu certa a idéia. E os negócios da CEAS caminhavam de vento em popa, sendo os recursos severamente fiscalizados pelo comandante geral.
De olhos e ouvidos abertos, o comandante estava atento aos acontecimentos da entidade que ele fundara. Que lhe era motivo de orgulho, pois dera certo, com grande prosperidade.


Os rebaixamentos

Apesar das mudanças, as cabeças dos poderosos, todavia, não mudaram. Continuavam rudes e perversas. As punições prosseguiam com a mesma intensidade. Com mais um elemento antigo: O rebaixamento.
Quando o policial não era expulso ou excluído, ele recebia uma punição, geralmente de 30 dias e rebaixado por 60, se graduado.
O que, realmente, significava este tal rebaixado? Significava que o graduado preso por 30 dias, num xadrez trancado a cadeado, e a partir do primeiro dia da punição, ele teria sua graduação rebaixada à graduação anterior, e, conseqüentemente, recebia os vencimentos da nova graduação, se a situação fananceira do homem já era ruim, ficava péssima.
Por exemplo: Se 3º sargento, passaria dois meses recebendo como cabo. E assim, acontecia com os demais.
Além dessa redução, o comando mandava descontar dos vencimentos do policial punido 30 dias de alimentação no rancho da corporação.
Ora, o que o policial ganhava não era suficiente para manter sua família, e imagine com o salário reduzido, mais o desconto em favor do rancho.
Continuavam acontecendo as mesmas arbitrariedades praticadas há mais de 40 anos, narradas em cápítulos anteriores.
Até aqui, escrevi esta história por informações dos mais antigos, todavia, para não deixar dúvidas, fui pesquisar nos arquivos de alguns jornais e no acervo histórico-cultural da Polícia Militar, este último, por sinal, está sendo destruído pelas traças.
Porém, a partir do capítulo seguinte a contarei por ter assistido no dia-a-dia da caserna.


As cabeças continuavam
as mesmas

Aqui, dou continuidade à história. Agora como testemunha, iniciando, exatamente, no dia 02 do mês de setembro de 1957, data que sentei praça, como soldado raso, na Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Norte.
Naquele tempo, não existia processo seletivo, exceto selecionar os documentos do pessoal a ser incorporado.
O índice de analfabetos nas novas turmas incorporadas circundava os vinte por cento.
Para ingressar em quaisquer cursos, não se exigia grau de estudo. O importante era ser aprovado na seleção.
Já para a seleção do curso de formação de oficiais, o candidato precisava ser possuidor do curso ginasial - o primeiro grau completo de hoje.
Continuava a interferência política, o apadrinhamento das pessoas alheias aos quadros da corporação e do estrelado interno, especialmente, das patentes mais elevadas.
Não cessaram as perseguições contra os estudantes. Dezenas de oficiais convocados ou ainda concluindo o tempo de serviço, que a tropa os chamava de cascas grossas. Esses oficiais carregavam consigo o resquício da antiguidade, e detestavam a nova safra de estudiosos.
Os próprios oficiais se consideravam culturalmente inferiores aos praças, pois um coronel, que fora para a reserva naquele tempo, disse para um sargento que estudava no Colégio Estadual do Atheneu:
"Você porque tem um saberzinho se acha muito importante".


O Burro falante


No tempo da Força Pública, um comboio de ciganos se arranchou na zona urbana da cidade de Baixa Verde, no Rio Grande do Norte, que depois mudou para João Câmara, em homenagem a um político ilustre daquela região.
Os burros dos ciganos viviam soltos e pulando dentro da cidade, causando transtornos à população, sem haver qualquer providência por parte das autoridades constituídas.
Um político da cidade procurou o chefe de polícia, ao qual comunicou o ocorrido e solicitou providências.
A autoridade mandou telegrama ao sargento delegado de polícia daquela cidade, determinando que fossem adotadas as providências cabíveis a fim de tranquilizar a população local.
Ao receber o telegrama, o sargento mandou apreender os burros da ciganada, mas logo foi informado pelo chefe dos ciganos que eles estavam desmontando as barracas e partiriam de imediato.
Resolvido o problema, o delega mandou um telegrama ao chefe de polícia nos seguintes termos:
"Senhor Chefe de Polícia: Comunico a Vossa Excelência que prendi 22 burros pertencentes aos ciganos, e um dos quais informou a esta autoridade que já estavam desarmando as barracas para deixarem esta cidade!"
No dia seguinte, saiu nos jornais de grande circulação no estado:
"Sensacional! Fantástico!! Impressionante!! Um burro falou ao Delegado de Polícia de Baixa Verde!..."